quarta-feira, 24 de abril de 2013

E a história segue...

Segue aqui o ultimo pedaço produzido da minha historinha. ^^


                O comerciante não tinha habilidades de rastreamento, todavia seu raciocínio apurado e conhecimento da região o levou até a próxima vila. No vale entre montanhas verdes e tímidas. Um lugar de trabalhadores campestres, mineiros e truculentos seres de índole questionável e paciência variável. O jovem não poderia ter chegado ainda à cidade, estava a pé e não conhecia os perigos da estrada. Ouviu há alguns dias sobre uma besta solta as redondezas com a cabeça a prêmio. Os relatos brutais beiravam o absurdo se pouco daquilo fosse verdade talvez tivesse de voltar o caminho e procurar à beira das estradas restos brancos e insípidos de carne morta.
                Com cuidado extra fez o caminho mais curto em um dia e meio chegando à estalagem da cidadela pouco antes do fim da tarde. Estava faminto e cansado. Trocou algumas palavras com o estalajadeiro e nenhuma notícia do viajante obteve. Como suspeitava, ele ainda não haveria de ter chegado. Teria tempo para bolar uma emboscada. Pensou em espalhar a má reputação do viajante e esperar sua captura, depois apenas pegaria sua lamina como troféu e regressaria. Não, aquele devia ser seu trunfo. Apenas seu.
                Com a prata da lua alta e turvada por folhas de antigas ávores, aguardava a fumaça áspera de seu cachimbo lhe clarear a mente quando ouviu rumores de um grupo de ladrões passando na região. Ladrões são boa fonte de mercadoria. Talvez os procurasse.
                Estava em pé, alto, chapéu de grandes abas e cachimbo em mãos, num ambiente com o vento entrando apertado pelas duras janelas e frestas da madeira torta, caminhando em direção a porta ouviu outro relato do ataque da besta sem nome. Sentiu a alma esfriar enquanto parava e voltava sua atenção a um garoto maltrapilho pálido de medo. As conversas na estalagem silenciaram conforme o menino falava. Homens sujos, com grossas barbas e poucas maneiras emudeceram frente ao menino sentado próximo ao balcão. Trêmulo falava rápido demais causando horripilante impressão. Disse ver antigos escritos sobre uma pedra ao lado dos restos de um cadáver rasgado na estrada do sul. O corpo, próximo a uma arvore partida, tinha lascas grossas de casca de madeira cravada nos olhos e o tórax aberto por um golpe vertical com garras. O golpe não deve ter sido rápido ou profundo o suficiente para matar instantaneamente, pois além do sangue no cadáver, boa quantidade de urina e fezes apodreciam no local. O garoto desmaiou após se aproximar e ver as vísceras da vitima ao chão formando letras. O forte cheiro lhe devolveu a consciência então correu como pode de volta a vila. O horror impediu de identificar qualquer palavra escrita, seja na pedra de sangue ou no chão de tripas.
                Um grupo de homens sacou as armas e partiu em direção à estrada sul. Talvez pela recompensa ou pela curiosidade de testar a história, foram. Voltou o comerciante e sentou novamente para aguardar o retorno da armada. Gostaria de saber a verdade sobre o caso ou contrataria o garoto por inventar histórias excelentes.
                Sua sorte diminuía. Ladrões e uma fera vagando ao redor de seu alvo. Se qualquer um encontrasse-o antes seria mais difícil adquirir a lâmina e não teria seu desforro.

***

                O Conselho dos Nove era velho e familiarizado com as barbáries da floresta. Detinham conhecimento suficiente para reconhecer prontamente mentiras cabulosas, delírios ou fatos hiperbólicos. Todo assunto trazido ao conselho chegava afundado em exagerações. Extraindo-se adjetivos nefastos com perguntas simples era possível polir as idéias. Porém, poucos adjetivos caíram sobre as historias do ser da floresta sem lei. Isso preocupou alguns conselheiros.
                Ninguém sabia ao certo a identidade dos que ali ocupavam poltronas escuras e altas em semicírculo, nem os próprios integrantes do grupo.  Chegavam ao posto por indicação dos chefes dos antigos clãs do oeste e apenas esses sabiam seus nomes. A cada um cabia alcunha secular dada ao cargo: a perfeição, o rei, o belo, o impar, o conquistador, o oculto, o mago, o viril e o juiz. Cada alcunha impregnada de fardo e glória. O único a mostrar a face era o belo, sendo assim, o porta-voz do conselho. Não havia ordem hierárquica e só através de unanimidade tomavam decisões. Acontecimento esse ainda não registrado desde a criação das nove cadeiras

continua ...